segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Atmosfera





A amiga que te cobra um porre
O amigo que te cobra ouvido
O tempo que te apressa, corre!
Já tá todo mundo envolvido

O pai te cobra um diploma
O vô cobra um bom mocismo
E você mora numa redoma
Acorda, hora do catecismo!

O padre te cobra uma oferta
A Igreja vigia a conduta
Os fiéis ficam de boca aberta
Se você xingar “filho da puta”

A puta te cobra o programa
A doença te cobra remédio
A droga te cobra por grama
Por alívio e depois, o tédio

A tela te mostra uma oferta
A novela doutrina a conduta
Programação na hora certa
Espectador da tele-disputa

A mãe te cobra magreza
A vó te cobra sustancia
O irmão acha que tá beleza
A genética é sua herança

O corpo cobra movimento
O espírito tenta fugir
A mente quer ter sentimento
Mas só sente a cabeça zunir

Te cobram a vida e a cura
Cada passo, salto ou tropeço
E lá na garganta, secura
Não sei se cura eu mereço

Deus te cobra um momento
Livre de qualquer moeda
Pra repousar seu tormento
Enquanto te livra da queda

Mas se o momento é tempo
Eu não tenho pra dar nem vender
Pai nosso, mas que mal intento
Filhos que nascem só pra morrer

Ao SAC do céu




Seria a liberdade uma moça jovem
Que não saiu da cabeça do filósofo?
Será que a liberdade precisa
Sair da cabeça para ser?

Será que a liberdade permite
Que se lhe toquem os seios fartos?
Ou seria a liberdade uma puritana
Que também caiu em contradição?

Será que é preciso permissão
Para lhe cheirar os cabelos?
Ou seria muita petulancia?
Ou seria muita confiança?

Será que eu posso algemá-la
Apertá-la, amassá-la e por na mala?
Apartá-la, amar sala, o mar sal
Será que ela entende de devaneio?

Será que posso achar que ela é minha
Só por ser inquilinamente moradora
Da cobertura do meu corpo
Com varanda e vista para o amar?

Será que ela me paga e eu não vejo
Ou será que me deve alguns meses?
Seria ela quem grita e esperneia lá em cima
Toda véspera de entrevista de emprego?

É ela que pisa no acelerador
Toda vez que é preciso rebeldia?
Será que a liberdade precisa
De umas aulas de direção?

Seria ela a professora
De toda a movimentação?
E, sem mesmo sair do lugar
Faria o moço levantar do sofá?

Será que é mesmo dela
Todo esse aparato sedutor?
Ou teria a liberdade se rendido
Ao bisturi ou ao silicone?

Será que ela começa e termina
Ou será que a liberdade é Deus?
Mas, será que Deus pôs silicone?
Tomara que a blasfemia não ouça

domingo, 13 de novembro de 2011

Empecilhos Empanados



Hoje eu ia fazer um poema
E esqueci
Ali entre a inspiração e o teclado
Eu perdi a atenção

Eu ia continuar um poema
Depois que saísse do banho
E ali entre o shampoo e a esponja
Lavei junto a memória

Mas esfriei a cabeça
E parece que alguém lá em cima
Percebendo minha peleja
Me mandou chuva, muita chuva

Agora sim, respirando melhor
Vou disparar a escrever
Gente, que escuro é esse?
Será que não paguei a conta?

E algo entre a chuva e o poste
Me apagou a vontade
Ou me acendeu a preguiça
Será que eu passei da conta?

O poste, o teclado, a chuva
A luz, a memória, o shampoo
Minha rotina tá me roubando poesia
Deve ser porque deixei na janela

Igual aquele bolo do desenho
Que fica ali pra esfriar
E vem o bicho e engole tudo
E se tá sem preço, é de graça

Eu perdi uma poesia
Enquanto me preparava pra ela
Me enfeitava e perfumava
Achando que gostasse da vaidade

Hoje eu ia escrever um poema
Mas será que o dicionário deixa
A gente ter certeza da dúvida
E duvidar da certeza?