segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Y da Silva



- Oi moça, boa tarde
Desculpa meu bucado de pressa
Meu caso é mesmo de fazer alarde
O dotô atende uma hora dessa?

- Não se chega assim de surpresa
Num balcão de atendimento
Não posso nem lhe dar certeza
Vou ver como tá o andamento...

Volte amanhã depois do almoço
Que lhe arrumo um horário apertado
Mas não repita isso, viu moço
Não me chegue aqui tão apressado!

- Oi seu médico, boa tarde
E obrigado por ser tão gentil
O peito me dói, e pra dizer a verdade
Multiplique isso por bem mais de mil

- Boa tarde, seu moço apressado
Venha cá que eu afiro a pressão
Esse pé parece um pouco inchado
Pelo visto tá em dia o coração

- Ô dotô, num me diga isso não
Que esse caso é grave, periga dar morte
Diga a verdade, enquanto eu faço oração
Me diz, quanto eu vivo caso tenha sorte?

- Rapaz, seu coração bombeia bem direito
As vistas e a coluna tão em ordem também
Diga, que mais sente além de dor no peito?
Andaste mesmo apanhando de alguém?

- De um só não, dotô
Pelo menos uns milhares vezes mil
Me escuta direito pufavô
E nem vem com a tal bezetacil

Essa é uma dor bem diferente
É de toda gente nascida comigo
Acho que minha geração tá doente
As vista só quer enxergar o umbigo

- Ô moço, então é esse o enfisema?
Primeiro pega um papel e uma caneta
E escreva assim em forma de poema
Que não vai nem precisar de receita

Saindo daqui corra na drogaria
E compre absolutamente nada
Não há veneno que inverteria
Caso de geração envenenada

Essa receita né pra remédio não
Dois ovos, leite, açucar, trigo
Mexa tudo, unte a fôrma com a mão
Ache alguém pra tomar café contigo

Corra ao laboratório e peça
Um exame de pulsação
Abrace a atendente e ela que meça
Se a batida sobe ao se aproximar coração

Tome a última dose de cura do dia
A todo que passar, dê compaixão
Dê, no mínimo, uma alegria
Pra dona rica e pro catador de papelão

Além da esmola, dê também a mão
Mostre interesse, além de só escutar
O consumismo é uma contramão
É em pessoas que devemos apegar

Volte a agendar consulta
Se achar que há necessidade
Espero que mude a conduta
De urgenciar tanta agilidade

- Ô dotô, sô me desculpe
Escrever a mão dá até um pavor
Vou em casa pegar o notebook
O senhor repete se eu pedir por favor?

2 comentários: